[align=justify]Prezados irmãos em Cristo,

Resolvi fazer uma pesquisa em um Portal de escola dominical que disponibiliza dicas para os alunos da EBD das Assembléia de Deus. Na busca interna do referido Portal fiz uma busca por: pecado. Nas  primeiras páginas de resultados encontrei o resultado abaixo, in verbis:

torcer pelo Brasil na copa do mundo é pecado?
comemorar o natal é pecado para os evangélicos?
evitar filhos, é pecado sim ou não?
é pecado usar calça comprida?
defesa pessoal é pecado?
dança; pecado ou não?
é pecado a ingestão de gordura animal!?
anticoncepcional??? é pecado???
ver filme porno junto com a esposa é pecado
beijo na boca é pecado
sexo oral entre casados é considerado pecado ela bíblia ou..?
atenção - teatro na igreja é pecado?
omissão é pecado?
é pecado comer sangue?
pirataria não é pecado! olha o cd barato aí!
rock é pecado?
..... é pecado?
pecado sim ou não?
pecados cibernéticos ?
é pecado...(sobre a lição do último domingo)

Acima estão apenas alguns questionamentos de professores da nossa denominação, por falta de espaço talvez não coubesse todas aqui mas, essa pequena seleção servirá de mostra.

Os administradores do referido Portal ufanam-se de possuirem um considerável acervo de perguntas e respostas disponíveis para os professores de EBD. A minha intenção aqui não é defenestrar o ministério de quem quer que seja, apenas apresentá-lo como radiografia da nossa denominação.
Tenho servido ao Senhor nas Assembleías de Deus há muitos anos e por diversas congregações e invariavelmente é essa mesma realidade da igreja local.
Paradoxalmente a graça tem se tornado alienante nas AD, tornando inconciliáveis a Graça e a Liberdade.

Apresento-vos o texto abaixo para reflexão:


[hr]


TODA GRAÇA, MAS NENHUMA GRACINHA!


A GRANDE questão é que a Graça é um problema para os cristãos desde o inicio. Ela é um problema na mesma medida em que por ela a Verdade nos Liberta, conforme o testemunho do Espírito de Deus em nossos corações.

Toda-via, quem, de fato, quer cura e libertação?

O problema da Graça é a liberdade que ela gera. Liberdade é apavorante, nos deixa sem chão, nos obriga a andar com as próprias pernas, concede-nos a benção de pensar, sentir, discernir e nos julgar.

O problema da Graça é que ela nos faz profundamente auto-conscientes e, ao mesmo tempo, nos dá a certeza de que diante de Deus a única voz que se faz ouvir não brota dos meus lábios, mas de minha consciência.

A Graça gera auto-consciência! E quem deseja ter uma? Muito pouca gente!

A maioria não deseja ter que decidir e assumir a responsabilidade de ter exercido a sua própria consciência diante de Deus e dos homens, e, sobretudo, diante de si mesmo.

Portanto, quanto mais Moral é um ser, menos consciência pessoal ele tem!

Consciência pressupõe a pre-existência de liberdade, e, esta, só se manifesta em plenitude na Graça, pois, é somente nela que se perde o medo de ser!

A questão é que a maioria das pessoas pensa que liberdade induz ao erro.

Nenhum erro poderia ser maior!

Paulo nos ensina que quanto mais Lei ou Moral, mais conhecimento do pecado. E, sendo assim, mais a neurose do pecado se instala em nós.

Ou seja, a Lei gera a certeza da culpa e esta nos deita nos braços do pecado. E por quê? Porque a Lei gera neurose, que produz a obsessão de vencer por conta própria “o pecado que habita em mim”, segundo Paulo.

E é Paulo também, como já vimos anteriormente, quem nos diz que a impossibilidade da Lei ser efetiva quanto a nos fazer viver com saúde vem do fato de que o condutor dela, o homem, está em estado terminal; ou seja, a inviabilidade da Lei é que ela se materializa pelo condutor essencialmente adoecido da natureza humana.

O paradoxo acontece quando se descansa em Cristo e em Sua Graça e, assim, para-se de lutar contra si mesmo.

Jesus já agradou a Deus em meu lugar!

E quando sou liberto de todo medo pelo amor de Deus revelado na Cruz— pois no perfeito amor não existe medo de nenhuma forma de juízo—, então, a alma encontra o seu ninho e experimenta uma paz que não foi produzida pela justiça-pessoal desse “pseudo-herói-humano das virtudes auto-conquistadas”.

Ao contrário, “o castigo que nos traz a paz estava sobre Ele (Jesus) e pelas suas pisaduras fomos sarados”. Assim, os doentes já estão sarados para poderem ser curados à medida que descansam no amor que tira da alma toda fobia, toda dívida e toda neurose.

Ora, quando isto acontece o mundo deixa de ser um lugar onde sou tentado, e passa a ser o lugar onde eu vivo. Não sou tirado do mundo, sou livre do mal. E isto só acontece quando se entende que esse “mal” nasce, antes de tudo, dentro daquele para quem todas as coisas são impuras.

Somente a Graça torna todas as coisas puras, para os puros. E é também a Graça que nos liberta dos tabus em relação a tocar coisas, nos salva do poder sedutor dos objetos estéticos de apreciação; e ainda dos gostos, das opções e escolhas de natureza pessoal; pois, é apenas quando a vida é desdemonizada, que se pode experimentar a plenitude dos nossos sentidos, sem nos deixarmos tomar pela sensualidade escravizada pela obsessão da sedução ou da posse.

“Os olhos são a lâmpada do corpo. Se os teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luminoso”—disse Jesus. •

Desse modo, repito: quanto mais a consciência está livre da culpa e do medo que advêm da fobia gerada pela Lei, mais livre estará o inconsciente humano de ser um projetor de sombras, pois, agora, esse modo luminoso de ver a vida, gerará uma luz interior que procede do inconsciente e reafirma as escolhas da consciência entregue à Justiça da Graça que vem da Cruz!

“Na Tua Luz vemos a luz”, já dissera Davi. E, assim, ele corrobora o fato psico-espiritual que é gritado nos evangelhos e, especialmente, por Paulo.

Todavia, o mais chocante de tudo isto é que Jesus afirmou “aos amigos de Jó” de Seus dias— os religiosos que praticavam a Teologia Moral de Causa e Efeito—, que sua cristalização à Lei e seu legalismo exterior, os havia tornado “filhos do diabo”; e, portanto, isto os colocava na posição de “querer satisfazer-lhe aos desejos”.

O intrigante é que esse discurso de Jesus não é dirigido aos que “quebravam a Lei”—meretrizes, publicanos e demais pecadores—, mas diretamente aos que se diziam os “mestres de sua observância”. Para Jesus esses eram os seres com maior poder de corromper e afastar o outro da experiência genuína de Deus.

E pior ainda: no contexto no qual Jesus faz alusão aos “filhos do diabo”, Ele afirma a existência de uma assembléia para tal declaração.

E que “assembléia” era está?

É justamente aquela que levara a Jesus uma mulher “apanhada em flagrante adultério”, e que deveria, de acordo com o literalismo utilitário com o qual eles liam as Leis de Moisés, ser morta por apedrejamento. A esses é que Jesus faz freqüentes referências à “vossa Lei.”

Ora, era a observância externa daquela Lei aquilo que os fazia “andar em trevas”, pois, o próprio Jesus lhes diria mais tarde:

“Se fosseis cegos, não teríeis pecado algum; mas, porque agora dizeis, nós vemos, subsiste o vosso pecado”•

A questão, então, é: de onde procede a declaração de Jesus a esses amantes exteriores do comportamento legal e moral, com suas obsessões de causa e efeito?

De um equívoco no entendimento do significado da Lei, pois, como diria Paulo, a “Lei foi dada para que avultasse” a consciência de pecado, e, portanto, para que pudesse haver uma conciência-consciente de sua irredimibilidade pelos instrumentos da Lei ou da Moral.

Então, quais são esses “desejos do diabo” que aqueles que estavam diante de Jesus desejavam realizar, sem o saberem e mesmo enquanto exaltavam sua filiação a Abraão?

Ora, tratava-se da “obsessão” de ser de Deus pela via da justiça própria e mediante o uso da Lei para poderem se tornar “homicidas” em relação ao próximo que não sabia, não queria, não se estimulava ou não cria naquela observância. A esses, eles desejam matar. Era uma “plebe maldita”, tornaram-se “párias” da religião, e foram sempre percebidos como os “perdidos da terra”.

Pois foi justamente entre esses que Jesus se sentiu melhor na terra e foi do meio deles que Ele recrutou os seus primeiros seguidores, tendo sido acusado, por causa disso, de ser “amigo de pecadores”.

Que desejo do diabo, então, era esse que os “filhos de Abraão”, a todo o custo, desejavam “satisfazer”?

Jesus diz claramente que era o da Teologia Moral de Causa e Efeito!

Era isto que gerava aquela compulsão homicida neles. E que era dirigida não apenas à “mulher adultera”—que quebrara esse principio e agora deveria experimentar o efeito como morte por apedrejamento—, mas, também, dirigia-se a Jesus, que não observava tal “mandamento”, no que tangia à sua aplicabilidade: “que tais mulheres sejam apedrejadas”— conforme vaticinavam os senhores do saber e da verdade.

Jesus se sentia perdendo menos tempo escrevendo um compêndio de verdades no “chão da terra”—mesmo que o vento apagasse em horas o que Ele escrevera no chão—do que dando atenção a pedradas reflexões desses seres adoecidos pela Moral e pela presunção da verdade.

Não há compulsão satânica mais forte na alma que aquela gerada pelo fanatismo à Teologia Moral de Causa e Efeito!

Esse é o “desejo do diabo” a ser satisfeito pela Lei e seus discípulos!

E quando vemos sua prática de modo grotesco, nos chocamos, como, por exemplo, quando homens-bomba, pilotos suicidas, terroristas jovens e outros fanáticos, crendo nessa Teologia, punem seus “opressores” com a morte e entregam-se a ela por uma razão: a teologia deles também é uma Teologia Moral de Causa e Efeito!

E, assim, voltamos ao principio outra vez:

Sempre que o consciente humano se deixa intoxicar dessa “Teologia Moral”, o inconsciente humano se enche de juízos, homicídios, taras, compulsões, e, também, por campos imensos de sombras, habitadas pelo monstro maligno que cresce nos labirintos da alma daquele que troca a verdade no intimo pelas performances exteriores, praticadas em nome de Deus, contra o próximo, porém, realizando de maneira dissimulada ou inconsciente, o desejo do “pai-diabo”, que sempre vem para “matar, roubar e destruir”.

Desse modo, devo outra vez afirmar que quanto mais Moral for o consciente, mais pagão será o inconsciente humano. E Paulo, melhor que ninguém, expressa esse fato da alma:

“Porventura, ignorais, irmãos (pois falo aos que conhecem a lei), que a lei tem domínio sobre o homem toda a sua vida? Ora, a mulher casada está ligada pela lei ao marido, enquanto ele vive; mas, se o mesmo morrer, desobrigada ficará da lei conjugal. De sorte que será considerada adúltera se, vivendo ainda o marido, unir-se com outro homem; porém, se morrer o marido, estará livre da lei e não será adúltera se contrair novas núpcias. Assim, meus irmãos, também vós morrestes relativamente à lei, por meio do corpo de Cristo, para pertencerdes a outro, a saber, aquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de que frutifiquemos para Deus”.

Paulo diz que na Cruz todos nós que um dia estivemos casados com a Lei nos tornamos viúvos desse ex-marido tirânico e despótico, que foi executado em Cristo e no cumprimento de toda justiça por Ele realizada a nosso favor, a fim de que agora possamos nos casar sem culpa e sem nada além da chance de um novo amor: o amor de Cristo que nos constrange e ser Dele por nada que não seja uma consciência grata e satisfeita.

Em Cristo fiquei viúvo da Lei para sempre!

E Paulo prossegue dizendo como o consciente-moral exacerba o paganismo do inconsciente:

“Porque, quando vivíamos segundo a carne, as paixões pecaminosas postas em realce pela lei operavam em nossos membros, a fim de frutificarem para a morte. Agora, porém, libertados da lei, estamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra".

Que diremos, pois? É a lei pecado?

De modo nenhum!

Mas eu não teria conhecido o pecado, senão por intermédio da lei; pois não teria eu conhecido a cobiça, se a lei não dissera: Não cobiçarás. Mas o pecado, tomando ocasião pelo mandamento, despertou em mim toda sorte de concupiscência; porque, sem lei, está morto o pecado.

Outrora, sem a lei, eu vivia; mas, sobrevindo o preceito, reviveu o pecado, e eu morri. E o mandamento que me fora para vida, verifiquei que este mesmo se me tornou para morte. Porque o pecado, prevalecendo-se do mandamento, pelo mesmo mandamento, me enganou e me matou. Por conseguinte, a lei é santa; e o mandamento, santo, e justo, e bom.

Acaso o bom se me tornou em morte?

De modo nenhum!

Pelo contrário, o pecado, para revelar-se como pecado, por meio de uma coisa boa, causou-me a morte, a fim de que, pelo mandamento, se mostrasse sobremaneira maligno. Porque bem sabemos que a lei é espiritual; eu, todavia, sou carnal, vendido à escravidão do pecado.”

E neste ponto Paulo mostra o nível dessa composição adoecedora: quanto mais Lei no consciente, mais desordem, caos e erupções compulsivas derramam suas lavas do fundo do inconsciente humano.

E mais: ele diz que essa não é uma “produção da Lei”, sendo antes disso uma geração do “pecado que habita em mim”, mas que ganha sua superlativação pela observância externa, moral e auto-justificatória que se deriva de todas as formas de tentativa de ser de Deus pela via de algum Código de Observância Legal:

“Porque nem mesmo compreendo o meu próprio modo de agir, pois não faço o que prefiro, e sim o que detesto”.

Ora, se faço o que não quero, consinto com a lei, que é boa. Neste caso, quem faz isto já não sou eu, mas o pecado que habita em mim.

Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem nenhum, pois o querer o bem está em mim; não, porém, o efetuá-lo.

Porque não faço o bem que prefiro, mas o mal que não quero, esse faço. Mas, se eu faço o que não quero, já não sou eu quem o faz, e sim o pecado que habita em mim.

Então, ao querer fazer o bem, encontro à lei de que o mal reside em mim. Porque, no tocante ao homem interior, tenho prazer na lei de Deus; mas vejo, nos meus membros, outra lei que, guerreando contra a lei da minha mente, me faz prisioneiro da lei do pecado que está nos meus membros.
Desventurado homem que sou! Quem me livrará do corpo desta morte?”.

Sem o descanso que vem da Graça em Cristo e da certeza de que Ele já agradou a Deus por mim, o que sobra é apenas a doença de ser, de onde se derivam todas as nossas neuroses, esquizofrenias e psicoses.

Paulo, porém, prossegue:

Graças a Deus por Jesus Cristo, nosso Senhor. De maneira que eu, de mim mesmo, com a mente, sou escravo da lei de Deus, mas, segundo a carne, da lei do pecado.

Agora, pois, já nenhuma condenação há para os que estão em Cristo Jesus. Porque a lei do Espírito da vida, em Cristo Jesus, te livrou da lei do pecado e da morte.

Porquanto o que fora impossível à lei, no que estava enferma pela carne, isso fez Deus enviando o seu próprio Filho em semelhança de carne pecaminosa e no tocante ao pecado; e, com efeito, condenou Deus, na carne, o pecado, a fim de que o preceito da lei se cumprisse em nós, que não andamos segundo a carne, mas segundo o Espírito.

Porque os que se inclinam para a carne cogitam das coisas da carne; mas os que se inclinam para o Espírito, das coisas do Espírito. Porque o pendor da carne dá para a morte, mas o do Espírito, para a vida e paz.

Por isso, o pendor da carne é inimizade contra Deus, pois não está sujeito à lei de Deus, nem mesmo pode estar. Portanto, os que estão na carne não podem agradar a Deus.”

“Estar na carne”, segundo Paulo, é ainda estar sob a Lei e sob suas observâncias e dependendo dela para a salvação, para a santificação ou para a autovalorização de si mesmo pela superioridade do Código Comportamental observado de modo jactancioso e, portanto, desumano; pois, como já disse, quanto mais Lei, mais perversidade e juízo haverá no inconsciente de seu praticante.

“Estar na carne”, portanto, para Paulo, era estar vivendo da presunção da Teologia Moral de Causa e Efeito.

Então, ele continua:

“Vós, porém, não estais na carne, mas no Espírito, se, de fato, o Espírito de Deus habita em vós.

E, se alguém não tem o Espírito de Cristo, esse tal não é dele. Se, porém, Cristo está em vós, o corpo, na verdade, está morto por causa do pecado, mas o espírito é vida, por causa da justiça.

Se habita em vós o Espírito daquele que ressuscitou a Jesus dentre os mortos, esse mesmo que ressuscitou a Cristo Jesus dentre os mortos vivificará também o vosso corpo mortal, por meio do seu Espírito, que em vós habita.”

E aqui Paulo, como já vimos antes, apenas repete o conceito de carnalidade manifesto por Jesus, como não poderia deixar de ser. Carnalidade, segundo o apostolo, é a arrogância da auto-justificação, é a doença de Caim, é a Síndrome dos amigos de Jó, é a piedade homicida dos observadores da Lei da Morte e que a usam para matar, excluir, julgar e descriminar o próximo, sem perceberem que eles, sim!—os tais “santos-de-si-para-si-mesmos” —, é que são os grandes doentes desta vida!

Os “doentes”, conforme o Evangelho, são o que acham que não precisam de médico.

Em Jesus Cristo, e por Ele ter quebrado na Cruz a Maldição da Lei, temos todas as nossas dívidas pagas e podemos experimentar a paz de consciência que liberta o nosso inconsciente de suas produções compulsivas e adoecidas:

“Assim, pois, irmãos, somos devedores, não à carne como se constrangidos a viver segundo a carne. Porque, se viverdes segundo a carne, caminhais para a morte; mas, se, pelo Espírito, mortificardes os feitos do corpo, certamente, vivereis.
Pois todos os que são guiados pelo Espírito de Deus são filhos de Deus. Porque não recebestes o espírito de escravidão, para viverdes, outra vez, atemorizados, mas recebestes o espírito de adoção, baseados no qual clamamos: Aba, Pai.”

Daqui para frente Paulo não admite mais que “estar na carne” seja apenas o pecado das meretrizes, mas, sobretudo, passa a ser o pecado dos fariseus, como de resto, este é o conceito apresentado por Jesus nos evangelhos, e que pode ser percebido pelo modo gracioso como Ele tratou os párias e pelo modo dramaticamente confrontador como Ele tratou o segundo grupo.

Paulo conhecia muito bem a mente dos fariseus. E foi por causa do discipulado um dia farisaicamente por ele vivido, que ele chega a dizer que veio a adoecer em sua alma.
A resposta de Paulo a quem quer que deseje trocar a neurose da Lei pela Paz que vem da Graça, é uma só. E ele diz que neste particular todas as assembléias se dissolvem e fica apenas o ser humano, sua consciência, sua certeza de impotência auto-salvadora, e sua grata e entregue dependência ao que Jesus já fez na Cruz, surgindo daí em diante uma espiritualidade do intimo, onde as conversas acontecem apenas entre o indivíduo e o Espírito de Deus:

“O próprio Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus. Ora, se somos filhos, somos também herdeiros, herdeiros de Deus e co-herdeiros com Cristo; se com ele sofremos, também com ele seremos glorificados. Porque, na esperança, fomos salvos.

Ora, esperança que se vê não é esperança; pois o que alguém vê, como o espera? Mas, se esperamos o que não vemos, com paciência o aguardamos.

Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis.

E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos.”

Ora, neste daqui em diante Paulo desmonta a lógica de toda e qualquer Teologia Moral de Causa e Efeito e acaba com as presunções de juízo dos amigos de Jó, quando diz:

“Sabemos que todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que são chamados segundo o seu propósito. Porquanto aos que de antemão conheceu, também os predestinou para serem conformes à imagem de seu Filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou; e aos que chamou, a esses também justificou; e aos que justificou, a esses também glorificou”.

E quando se chega a esse nível de percepção e experiência da fé, os inimigos passam a ser “inimigos-de-si-mesmos”, pois, esse ser liberto pela Graça, já não reconhece mais os seus juízos:

Que diremos, pois, à vista destas coisas?

Se Deus é por nós, quem será contra nós?

Aquele que não poupou o seu próprio Filho, antes, por todos nós o entregou, porventura, não nos dará graciosamente com ele todas as coisas?

Quem intentará acusação contra os eleitos de Deus?

É Deus quem os justifica!

Quem os condenará?

É Cristo Jesus quem morreu ou, antes, quem ressuscitou, o qual está à direita de Deus e também intercede por nós!

Quem nos separará do amor de Cristo?

Será tribulação, ou angústia, ou perseguição, ou fome, ou nudez, ou perigo, ou espada?

Como está escrito: Por amor de ti, somos entregues à morte o dia todo, fomos considerados como ovelhas para o matadouro.
Em todas estas coisas, porém, somos mais que vencedores, por meio daquele que nos amou.

Porque eu estou bem certo de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem as coisas do presente, nem do porvir, nem os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus, nosso Senhor.

Ninguém está livre de sucumbir, ainda que de vez em quando, à Teologia Moral dos Amigos de Jó. E nem mesmo Pedro esteve imune a esse mal. Essa “doença teológica” é poderosa, dissimulada, auto-glorificante, conveniente à imagem da piedade medíocre, especializa-se em “médias”, e vive de barganhas com o próximo, num mundo onde quem eu sou vale menos do que aquilo que os outros esperam de mim.
Foi numa dessas situações que Paulo teve que enfrentar a Pedro e salvá-lo desse engano. E isto tem como introdução a afirmação de Paulo quanto a ter vivido a sua própria consciência na presença de Deus, sem se submeter a nada que não fosse a pura e simples Graça de Deus em Cristo, que a ele veio não como pacote “teologicamente sistematizado”, mas por pura e simples “revelação”:

“Catorze anos depois, subi outra vez a Jerusalém com Barnabé, levando também a Tito. Subi em obediência a uma revelação; e lhes expus o evangelho que prego entre os gentios, mas em particular aos que pareciam de maior influência, para, de algum modo, não correr ou ter corrido em vão. Contudo, nem mesmo Tito, que estava comigo, sendo grego, foi constrangido a circuncidar-se. E isto por causa dos falsos irmãos que se entremeteram com o fim de espreitar a nossa liberdade que temos em Cristo Jesus e reduzir-nos à escravidão; aos quais nem ainda por uma hora nos submetemos, para que a verdade do evangelho permanecesse entre vós. E, quanto àqueles que pareciam ser de maior influência (quais tenham sido, outrora, não me interessa; Deus não aceita a aparência do homem), esses, digo, que me pareciam ser alguma coisa nada me acrescentaram; antes, pelo contrário, quando viram que o evangelho da incircuncisão me fora confiado, como a Pedro o da circuncisão (pois aquele que operou eficazmente em Pedro para o apostolado da circuncisão também operou eficazmente em mim para com os gentios) e, quando conheceram a Graça que me foi dada, Tiago, Pedro e João, que eram reputados colunas, me estenderam, a mim e a Barnabé, a destra de comunhão, a fim de que nós fôssemos para os gentios, e eles, para a circuncisão; recomendando-nos somente que nos lembrássemos dos pobres, o que também me esforcei por fazer.

Quando, porém, Pedro veio a Antioquia, resisti-lhe face a face, porque se tornara repreensível.

Com efeito, antes de chegarem alguns da parte de Tiago, comia com os gentios; quando, porém, chegaram, afastou-se e, por fim, veio a apartar-se, temendo os da circuncisão. E também os demais judeus dissimularam com ele, a ponto de o próprio Barnabé ter-se deixado levar pela dissimulação deles.”.

Desse ponto em diante o que se lê é a “pregação” de Paulo a Pedro e aos demais que haviam caído por um momento de sua consciência da Graça e haviam negociado sua liberdade em Cristo com aqueles para os quais a Graça ainda era um “escândalo”: alguns cristãos legalistas e cerimonialistas de Jerusalém.

E, assim, Paulo prossegue:

Quando, porém, vi que não procediam corretamente segundo a verdade do evangelho, disse a Pedro, na presença de todos: Se, sendo tu judeu, vives como gentio e não como judeu, por que obrigas os gentios a viverem como judeus?

Nós, judeus por natureza e não pecadores dentre os gentios, sabendo, contudo, que o homem não é justificado por obras da lei, e sim mediante a fé em Cristo Jesus, também temos crido em Cristo Jesus, para que fôssemos justificados pela fé em Cristo e não por obras da lei, pois, por obras da lei, ninguém será justificado.

Mas se, procurando ser justificados em Cristo, fomos nós mesmos também achados pecadores, dar-se-á o caso de ser Cristo ministro do pecado?

Certo que não!

Porque, se torno a edificar aquilo que destruí, a mim mesmo me constituo transgressor.

Porque eu, mediante a própria lei, morri para a lei, a fim de viver para Deus.

Estou crucificado com Cristo; logo, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e esse viver que, agora, tenho na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e a si mesmo se entregou por mim.

Não anulo a Graça de Deus; pois, se a justiça é mediante a lei, segue-se que morreu Cristo em vão.

Mesmo entendendo o que Paulo nos disse até aqui o temor da maioria dos cristãos é que a Graça as entregue a si mesmas.
Ora, isto é apavorante para grande parte dos cristãos que eu conheço. E entre esses muitos há muita gente sincera, porém, existindo num limbo onde nem se entregam aos rigores da Lei e nem se rendem alegremente àquilo que Jesus conquistou para nós na Cruz!

A questão é que a Graça não nos entrega a nós mesmos, ela nos liberta de nós mesmos e nos põe no caminho desneurotizado de uma obediência que não se baseia no medo de Deus, mas na alegria amorosa de servi-Lo, buscando Nele aquilo que realiza o bem de Deus em nossas vidas.

A Graça não é compatível com a entrega da vida a pratica do pecado e da iniqüidade!

Isto porque se há Graça, então, também há santidade. E essa santidade não é Moral, é, antes disso, o fruto do Espírito em nós, conforme nos ensina Paulo:

“Digo, porém: andai no Espírito e jamais satisfareis à concupiscência da carne. Porque a carne milita contra o Espírito, e o Espírito, contra a carne, porque são opostos entre si; para que não façais o que, porventura, seja do vosso querer. Mas, se sois guiados pelo Espírito, não estais sob a lei.
Ora, as obras da carne são conhecidas e são: prostituição, impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias, inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções, invejas, bebedices, glutonarias e coisas semelhantes a estas, a respeito das quais eu vos declaro, como já, outrora, vos preveni, que não herdarão o reino de Deus os que tais coisas praticam.

Mas o fruto do Espírito é: amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio. Contra estas coisas não há lei.

E os que são de Cristo Jesus crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências. Se vivemos no Espírito, andemos também no Espírito. Não nos deixemos possuir de vanglória, provocando uns aos outros, tendo inveja uns dos outros.

Veja que é o “andar no Espírito” aquilo que nos tira de sob a Lei, e, ao mesmo tempo, também nos liberta das “concupiscência da carne”. Então, Paulo mostra uma série de “obras da carne”, as quais, não são, necessariamente, nem morais e nem imorais. Elas são apenas as “obras da carne”, portanto, o fruto da presunção humana de autonomia em relação ao “andar no Espírito”, pois, “são opostos entre si”.
A oposição entre as “obras carne” e o “andar no Espírito” não significa nenhum tipo de dualismo ou dicotomia, conforme a perspectiva grega, seja a do platonismo, seja a do gnosticismo ou seja a disfarçada departamentalização da compreensão do ser gerada pelo Aristotelismo.

Conforme já vimos diversas vezes neste livro, aquilo que Paulo chama de “obras da carne” e que existe em oposição ao “andar no Espírito”, tem relação não com algum tipo de “divisão” entre os mundos material e espiritual, onde se admita que tudo o que é material seja mal e tudo o que é espiritual seja bom.

Na perspectiva do Evangelho, quando Deus se encarna —ou seja, se materializa —, não há um abismo de natureza crítica entre ambas as dimensões, a não ser aquelas estabelecidas pela Moral Humana e que, como já vimos, a Encarnação do Verbo relativizou completamente em sua própria instalação.

Desde que se diz, explicitamente, que o Espírito seria derramado sobre “toda carne”, que também se afirma à possibilidade não dual da relação entre os mundos físico e espiritual.

Assim, a “oposição” entre carne e Espírito, nos fala apenas da presunção de confiar nas produções da autonomia humana em relação a descansar inteiramente na Graça. Isto é o que nos põe na “carne”, pois, ela se expressa como incapacidade de entregar as produções do esforço humano à Graça de Deus. E não se fazendo assim, institui-se justamente aquilo que não nos deixa “andar no Espírito”, visto que tal façanha, só é possível quando o coração crê que “aqueles que estão na carne não podem agradar a Deus”.

Desse modo, as “obras da carne” aparecem, independentemente de serem ou não moralmente aceitas numa dada sociedade e em seus “acordos morais”, como sendo, mesmo assim, “inimizade contra Deus”.

Na Lista de Paulo acerca das obras da carne—que começa com a prostituição e termina em glutonarias—, vemos o serpenteamento de seus conceitos descritivos das “obras da carne” incidirem e não incidirem sobre as linhas da Moral vigente. Por exemplo: dessa Lista paulina de “obras da carne”, nos dias de hoje, no meio social mais amplo, praticamente apenas a prostituição continua, relativamente, sob desaprovação. Quanto às demais coisas, todas elas, não são consideradas produções imorais, pois, não há reprovação social para elas, desde que sejam praticadas com discrição e com a devida etiqueta; ou seja, sem baixaria.

Já no meio cristão, a lista cresce para ainda incluir, moral e espiritualmente falando, apenas mais as seguintes práticas, além da prostituição: impureza, lascívia, idolatria, feitiçarias e bebedices. Na pratica da “consciência cristã”, de fora estão a maior parte dos pecados considerados não morais e não espirituais da Lista, que são aqueles de natureza psicológica, a saber: inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções, e invejas. Ficando fora da lista cristã, inclusive, a glutonaria, pois, se fosse incluída, muita gente teria que começar a buscar urgentes dietas e regimes alimentares como parte de suas leis devocionais.

Ora, isto mostra apenas duas coisas. A primeira é a seletividade da escolha cristã em relação ao que julga ou não importante para si mesma, portanto, não se colocando sob a Palavra de Deus, mas sob seu próprio critério de legitimação de importâncias. A segunda é a identificação dos valores usados pelos cristãos de hoje para fazerem essa seletividade na Bíblia, e que se baseiam em dois critérios: um de natureza Moral –prostituição, impureza, lascívia e bebedices—, pois, no meio cristão as fraquezas da área sexual são entendidas como as mais graves, visto serem percebidas como morais, e o mesmo se pode dizer da embriaguez crônica—ou seja, das bebedices—; e outro critério de natureza espiritual, que são as idolatrias e as feitiçarias.

Ora, aqui também vale dizer que se fizermos dessa lista de “obras da carne” uma Lista Legal ou Moral relacionada à salvação ou à santificação nenhum de nós à ela sobreviverá. Ou seja: pelos rigores de obediência interna e externa à essa Lista, nenhum de nós herdará o reino dos céus. Isto porque é fácil escolhermos dela quatro ou cinco coisas que do nosso ponto de vista sejam malignas, de natureza moral e espiritual, e, assim, cairmos no mesmo problema que Paulo condena, pois, gera “inimizade contra Deus”.

Isto porque ao fazermos de qualquer coisa Lei, nos colocamos, outra vez, sob a necessidade de sua observância absoluta!

Então, sair da Lei e cair na Lista, nos manda a todos nós de volta para o mesmo banco de condenados. Especialmente porque essa seletividade não nos é permitida, caso desejemos nos justificar mediante a observância parcial da Lista, pois, do contrário, estamos também desfazendo o escândalo da Cruz.

E quando olhamos para os demais vícios e doenças da lista de obras da carne que nós deixamos de fora do código de importâncias cristãs, fica clara uma coisa: para os cristãos de hoje, o comportamento observável e preso apenas aos elementos de natureza sexual—prostituição, lascívia e impurezas— e aqueles que ferem as doutrinas espirituais da fé cristã— feitiçaria e idolatria—, são os únicos que nos perturbam. Os primeiros são considerados de natureza Moral e os dois últimos de natureza doutrinária. Ou seja: tudo o mais da Lista, e que envolve crescer na perspectiva interior, psicológica e espiritual, não nos interessa. Interessam-nos apenas aquelas coisas que servem para ser mostradas; ou seja: aquilo que aparece na perspectiva comportamental.

Nada, contudo, do que acontece dentro da mente, parece ter real valor para os cristãos, pois, do contrário, não poderíamos falar sequer de qualquer história cristã, pois, a nossa História tem sido as narrativas de nossas “inimizades, porfias, ciúmes, iras, discórdias, dissensões, facções e invejas”—sempre muito bem dissimuladas com tratamentos “fraternos” e “piedosos”, na melhor das hipóteses!

Então, perguntamo-nos: Se for assim, quem se salva? pois Paulo diz que “não entrarão no reino de Deus os que tais coisas praticam”?

Ora, ele começa dizendo que o que nos salva é estar em Cristo e andar no Espírito. Quem está em Cristo já não está sob a Lei, nem mesmo as da Lista de Paulo. E quem anda no Espírito, vai sendo levado não para o caminho de baixo—o das animalidades entregues a si mesmas—, mas para as veredas mais elevadas da consciência, pois, contra o “fruto do Espírito”—amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio—, não há Lei.

Portanto, outra vez, aprendemos QUE O PRODUTO DA GRAÇA É SANTIDADE DE SER; o que nos salva da escravidão do legalismo e também da falsificação da Graça na forma de libertinagem.


Caio Fábio D'Araújo Filho. [/align]


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